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Pastores queimam Corão e despertam a ira do Afeganistão

O escritor Àsad Afghan, 20 anos, acha que a situação vai ficar bem pior no Afeganistão. O pastor norte-americano Terry Jones, da pequena igr...

O escritor Àsad Afghan, 20 anos, acha que a situação vai ficar bem pior no Afeganistão. O pastor norte-americano Terry Jones, da pequena igreja Dove World Outreach Center (em Gainesville, na Flórida), desistiu anteontem de queimar o Corão. Não foi o bastante para reduzir o nível de violência no país, ocupado por tropas dos Estados Unidos desde outubro de 2001. Pelo terceiro dia consecutivo, protestos violentos deixaram ontem dois mortos e dois feridos em Pul-i-Alam, na província de Logar (leste).

Aos gritos de “Morte à América”, muçulmanos mais uma vez atacaram lojas e incendiaram pneus e cartazes de candidatos das eleições parlamentares, que ocorrem no próximo sábado. Mohammad Rahim Amin, chefe do distrito de Baraki Barak, contou à agência Associated Press que soldados afegãos abriram fogo contra centenas de manifestantes. “As pessoas estão nervosas. Em todo lugar, há muçulmanos tristes. A profanação do Corão representa uma chance de ouro para a rede Al-Qaeda”, opinou Àsad, que vive em Khost, a 250km de Logar. “Muitas pessoas se juntarão a Osama bin Laden e ao Talibã.”

A menção de Jones de queimar as escrituras do islã criou um precedente perigoso. Nos EUA, pastores e ativistas dos estados de Tennessee e Wyoming fizeram o que o pregador da Flórida não teve coragem. Ao meio-dia de sábado, em pleno aniversário dos atentados de 11 de setembro de 2001, Bob Old e Danny Allen borrifaram fluido de isqueiro em exemplares do Corão e atearam fogo, em Springfield (Tennessee). O gesto foi repetido por Duncan Philip, do movimento Equipe de Resposta à Tirania, nas escadarias da sede do Legislativo, em Cheyenne, capital do Wyoming.

Em entrevista ao Correio, Old garantiu que não teve a intenção de ofender o islã. A Christian Church, igreja da qual Old se diz membro, esclareceu em seu site que não tem vínculo algum com o pastor.

Por telefone, Nihad Awad — diretor executivo do Conselho sobre Relações Americano-Islâmicas (Cair, pela sigla em inglês) — criticou Old, Allen e Philip. “Considero muito infeliz o fato de pastores que se clamam caridosos serem tão ofensivos”, desabafou. “Esse gesto reflete quem eles são: pessoas que tentam chamar a atenção.” Ele alerta que os imitadores de Terry Jones representam um perigo para si mesmos. “O que eles fazem apenas expõe o que eles pensam. São oportunistas”, acrescenta. Para Awad, a violência no Afeganistão se justifica pelo fato de muitos muçulmanos acreditarem que comportamentos religiosos têm grande representatividade entre cristãos e judeus dos Estados Unidos. “O melhor modo de defender o Corão é disseminar a ideia contida nele, do perdão.”

O Correio entrou em contato com a Dove World Outreach Center e recebeu a notícia de que Jones, o pastor que instigou os “imitadores”, fará um comunicado à imprensa no meio dessa semana. Em Springfield, a atitude de Old recebeu a reprovação de colegas. O reverendo Larry Herbert, da Faith Convenant Church, disse à reportagem que a fogueira de Corões foi algo errado. “Old terá de prestar contas a Deus. Ele precisará lidar com Deus, por conta própria. Tudo o que sei é que continuarei ensinando a palavra do Senhor e ajudando as pessoas a viverem uma vida correta”, disse à reportagem, por telefone.

Mesquita

O clérigo defensor da construção de um centro islâmico — que incluiria uma mesquita— a duas quadras do Marco Zero, em Nova York, alertou que mudar a localização do projeto seria contraproducente. “Isso daria a impressão de que o islã está sob ameaça nos EUA”, disse o imã Feisal Abdul Rauf à emissora de televisão ABC News. “Fortalecerá os extremistas muçulmanos, ajudará a sua capacidade de recrutamento e colocará nossos soldados em perigo, nossas embaixadas e nossos cidadãos”, acrescentou o religioso.

Entrevista BOB OLD
“O que fiz foi pela fé”

O pastor norte-americano Bob Old, de 58 anos, atendeu ao telefonema com um certo receio. Antes de aceitar falar ao Correio, ele perguntou o propósito da entrevista e pediu paciência. “Não escuto direito”, afirmou. O religioso que queimou exemplares do Corão, o livro sagrado do islã, no quintal de sua casa, em Springfield (Tennessee), garante que “sente muito” por seu gesto. Mas está longe do arrependimento. “O que fiz foi um ato de fé”, admite. Old acusou Maomé de ser um “falso profeta” e assegurou que o Corão sofreu várias modificações ao longo dos séculos. “Achei que queimar um livro foi melhor do que sequestrar três aviões, arremessá-los contra prédios e matar gente inocente”, declarou. O pastor não teme por sua vida e diz que agiu em nome do amor e da paz.

Por que o senhor decidiu queimar o Corão?
Eu pensei de coração, por muito tempo, sobre fazer isso. Mas… Eu o fiz por três razões. Em primeiro lugar, quis falar com os irmãos em cristianismo, da minha igreja. E dizer a eles que somos o que somos porque somos discípulos criados em nossa igreja. Em segundo lugar, para falar com o povo norte-americano. E para dizer que somos o que somos porque não entendemos a Constituição que nos foi dada por nossos fundadores. A Constituição nos foi dada às custas do sacrifício de muitas vidas. Não para a liberdade de religião, como ela declara. Isso significaria que ela permitiria a adoração a qualquer Deus. A Constituição foi uma ruptura em relação à Inglaterra, em relação à adoração e à liberdade. Os fundadores falaram aos índios que viviam aqui, e sobre como escrever e pronunciar o inglês. Então, lhes ensinaram as escrituras. Eu me dirigi aos muçulmanos porque minha Bíblia me ensina o amor e a compaixão. Eu disse a eles que estavam adorando um falso profeta e um falso Deus. Minhas escrituras pedem-se para ser compassivo e inofensivo o máximo que eu puder, a fim de demonstrar-lhes o que isso causará a suas almas. E que isso vai levar o mundo a uma guerra. Para passar as mensagens de compaixão e amor, achei que queimar um livro foi melhor do que sequestrar três aviões, arremessá-los contra prédios e matar gente inocente. O objetivo foi usar as ferramentas que nossa nação nos dá — uma nação livre — para ser capaz de falar aos homens, sem qualquer retribuição. Essas são as razões que utilizei para queimar o Corão.


O que o livro sagrado do islã representa para o senhor?
Para mim, o Corão é de um falso profeta. Eu respeito meus amigos muçulmanos. Eles fazem um bom trabalho, ensinam suas disciplinas e doutrinas e fazem o que a Bíblia nos diz para fazer de coração. Eles podem ter suas pessoas se virando em direção a Meca, três vezes ao dia, enquanto passamos por tempos difíceis para trazer nosso povo à igreja. Eu os respeito. Meu coração dói por eles. Eu estudei e li o Corão. Eu acredito que o irmão Maomé, que disse ter recebido sua mensagem do anjo Gabriel, não tinha testemunhas. Ele teve de memorizar tudo o que o anjo lhe disse e passar para sua mulher, que angariou crentes. Capítulos e escrituras têm se perdido no Corão. Muitos textos do livro foram queimados. Eu acredito que esse foi o único modo de eu levar minha mensagem de amor a todas essas pessoas. Eu sinto muito por qualquer dor ou dano que eu tenha causado a qualquer um. Eu estou pronto para sentar a qualquer momento com um imã e falar sobre as escrituras. Mas agora me sinto hesitante, pois a promessa que fizeram ao pastor (Terry Jones) da Flórida foi quebrada. Não ouvimos clamor contra o que os muçulmanos americanos estão fazendo. Só há queixa de que estão sendo perseguidos.

Seu gesto não pode estimular a Al-Qaeda a atacar os EUA?
Eu rezo para que isso não ocorra. Isso não é o que desejo que ocorra. Eu sou tolerante com a fé das outras pessoas e com o que elas acreditam. Mas não posso ser tolerante o bastante para vê-los (muçulmanos) vindo ao meu país, pegando a Constituição e usando-a contra nós para construírem uma mesquita exatamente no lugar onde mataram 3 mil inocentes. Eu escolhi simplesmente queimar um livro. Eles poderiam ter feito isso com nossa bandeira. Em vez disso, queimaram 3 mil pessoas.

Muitas pessoas o acusam de buscar os holofotes, à margem de Terry Jones…
Se eu quisesse publicidade, eu colocaria cartazes nos 20 andares de uma torre, só para mostrar o que fiz. Mas o que fiz foi um ato de fé. Eu acredito que meu Deus me dá o direito de defender as escrituras, de permanecer ao lado de minha nação e de minha Constituição. O que fiz foi para que nossas tropas saibam que não estão lutando por nada. Há pessoas que creem fortemente que o que nossos soldados fazem é bom.

O senhor não teme por sua vida? Chegou a receber alguma ameaça de morte desde ontem (sábado)?
Não, eu não recebi nenhuma ameaça desde a queima do Corão, senhor. Não temo por minha vida. Eu acredito que o que fiz não foi um ato de violência. Foi meu modo pacífico de disseminar minha mensagem. Eu não estou tentando forçar ninguém a mudar o local da mesquita, como meu irmão na Flórida (Terry Jones) está fazendo. Meus amigos muçulmanos, que já queimaram Bíblias e bandeiras dos EUA, entendem a liberdade de que falo e que meu gesto foi em paz. (RC)/Correio brasiliense

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